29/10/2018
Mesmo de alta na perícia do INSS, trabalhadores não conseguem voltar ao trabalho
— Esse é o limbo previdenciário. A pessoa não sabe para onde vai nem o que fazer. O INSS alega que o trabalhador está apto para o trabalho, mas o médico da empresa, na hora da reintegração, diz que não. É um momento de insegurança total. O profissional fica sem o benefício e sem o salário mensal, pois não pode trabalhar — explicou Sílvia Maia Xavier, advogada previdenciária.
Dados recentes da Associação de Juízes Federais (Ajufe) mostram que o pente-fino do INSS causou uma grande judicialização — quando o segurado, por algum motivo, questiona a decisão do órgão em cortar o benefício. Conforme publicado pelo EXTRA, tribunais federais de todo o país ficaram sem dinheiro para realizar as perícias judicias em agosto, o que obrigou o governo federal a fazer um repasse emergencial.
— O INSS tem usado o Judiciário como uma segunda instância quando a empresa afirma que o trabalhador não está apto para o trabalho após a alta do instituto. O órgão deixa para o juiz federal ou do trabalho a análise pormenorizada da doença do segurado, o que não deveria acontecer. Além disso, laudos divergentes dos segurados atrasam os processos e deixam o trabalhador sem amparo por muito tempo — acrescentou a advogada.
Valmir Souza, mestre de obras de 58 anos, conta:
— O INSS me deu o auxílio-doença no meio do ano passado, mas em junho deste ano o cortou. Quando retornei à empresa, eu quase não tinha força nos braços, e a construtora em que trabalho não me aceitou de volta. Agora, estou sem o salário e sem o auxílio. O jeito é ir à Justiça com o laudo da empresa, que afirma que estou inapto para a função. Os medicamentos que tomo são caros, e preciso de fisioterapia frequente. Como vou bancar tudo isso? O jeito é pedir a ajuda de parentes e amigos, enquanto as coisas não se resolvem.
Ações podem demorar meses
Outra dificuldade encontrada pelo trabalhador que recebe alta do INSS, mas não se sente apto a retornar à empresa, é saber como recorrer à Justiça para reaver o benefício previdenciário. Se o segurado tem vínculo empregatício, geralmente recorre à Justiça do Trabalho, porém, para questionar a perícia do INSS, ele deve entrar com um processo na Justiça Federal. A ação, porém, pode levar meses para ter decisão, o que deixa o interessado sem amparo financeiro.
Diante do problema, especialistas chamam atenção para um projeto que pode desafogar o Judiciário em ações que se arrastam ao longo de anos. A perícia conciliatória, que já é usada pela Justiça Federal do Rio, é uma maneira de acelerar processos e evitar erros na hora das avaliações médicas.
A perícia conciliatória funciona da seguinte maneira: o segurado entra com o processo na Justiça Federal e, antes de dar seguimento à ação — o que pode demorar muito, dependendo da região em que o segurado mora —, o INSS envia um perito que fará a avaliação do trabalhador com o perito da Justiça Federal. Isso faz com que diminua consideravelmente a quantidade de erros e altas indevidas. Especialistas em Previdência defendem a expansão do modelo para todo o país.
Patrão tem deveres com o trabalhador
Quando um funcionário retorna do período de auxílio-doença, algumas regras precisam ser cumpridas. Segundo a advogada especialista em Direito Previdenciário Patrícia Neves Bezerra, a empresa não pode encostar o trabalhador ou demiti-lo. Além disso, deve manter os benefícios previstos em contrato.
— Se a empresa entende, por meio de exame feito pelo médico do trabalho, que o funcionário não está apto para a função que ele exerce e o encaminha para o INSS, o empregador não pode demiti-lo — afirmou.
Em alguns casos, especialmente os de auxílio-doença concedido por acidente de trabalho, existe uma estabilidade provisória de um ano após o retorno. Além disso, o contratante tem que manter o depósito do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) e o plano de saúde. A dica é ficar de olho nos direitos.
Vale destacar, porém, segundo Patrícia, que se o funcionário se considera apto para o trabalho, e o INSS endossa tal situação na perícia de reavaliação, o trabalhador pode pedir sua reintegração mediante o ajuizamento de uma reclamação na Justiça do Trabalho. O processo, neste caso, não é demorado, pois a Justiça entende, após a análise do laudo do INSS e da afirmação do próprio trabalhador, que o mesmo está apto para voltar à sua função.
Fonte: Jornal Extra